Por Sonia Nogueira.
"Uma cena inusitada. Embaixo da árvore, na praça, o olhar fixou a cena por alguns minutos. Um senhor esquelético, só osso. A carne parecia que não existia sob a pele queimada. Varria o local. Tudo arrumadinho. Uma caixa, talvez contendo míseros mantimentos adquiridos com as moedas extraídas dos passantes, algumas molambos encardidos, uma criança de cara suja, uma mulher sorridente, um cachorro.
"Uma cena inusitada. Embaixo da árvore, na praça, o olhar fixou a cena por alguns minutos. Um senhor esquelético, só osso. A carne parecia que não existia sob a pele queimada. Varria o local. Tudo arrumadinho. Uma caixa, talvez contendo míseros mantimentos adquiridos com as moedas extraídas dos passantes, algumas molambos encardidos, uma criança de cara suja, uma mulher sorridente, um cachorro.
A mulher sorridente sim! Nunca vi mulher sorrir na miséria! Mulheres atiradas ao destino tem rosto áspero, olhar de ódio faiscando à uma simples palavra de desagrado. Mas vi-a sorrindo quando lhe atiraram uma cédula, eu não sei a quantia, seria talvez de uma quantia nunca recebida e daria para uma noite de Natal, uma só noite, que valia por uma noite apenas, mas valia. Amanhã o mesmo ódio se instalaria no rosto desengano com a vida.
Somente o cachorro criara carne e estava roliço. Na praça, os restos de comida jogados ao chão era banquete de qualidade para um vira-lata, pequenino ainda.
Quase dez da noite, perigo iminente em qualquer praça, mesmo em bairro residencial. Ao redor casas iluminadas, cadeiras nos jardins, entram e saem amigos. Clima de festa.
A sobrinha desceu para pegar iguarias encomendadas, na confeiteira. O olhar deu um giro ao redor. Na quadra, se havia quadra de jogos, estava mal conservada; um carrinho de pipoqueiro, guarnecido por cadeado; rede elástica, onde crianças pulavam, aguardando o próximo desafio.
Observei uma lapinha artificial, na casa em frente, com luzes ofuscando, presentes caros, bolinhas coloridas imagens de santos e animais adorando o Jesus Menino.
Fixei o olhar na cena ao lado: uma lona velha cobria a pequena árvore contra o sereno da noite. O cachorro deitado olhando atento para sua dona, a criança, dormindo em molambos à luz de lamparina, luz que apaga as trevas, a fumaça para espantar mosquitos era como incenso ofertado ao Jesus Menino.
Mas estava lá, a lapinha, no desejo oculto, sem poder ou sofisticação. Foi aí, neste recurso natural, que vi por instinto, para não apagar e perpetuar a história, uma lapinha natural. Os pais sentados no chão, guardiões da filha, um cachorro, uma lamparina para espantar as trevas. Uma família á margem da sociedade, sem o colorido artificial dos festejos..
Pintei na mente, uma lapinha, era um quadro vivo no Natal.
Feliz Natal a todos."
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