Totonho Laprovitera e o primo Pietro Guerrera, em Praia a Mare, 1994. |
Já faz algum tempo.
Hóspedes dos queridos primos calabreses Angelina e Pietro Guerrera, eu e Elusa passamos alguns dias em Tortora, ao sul da Itália.
De Roma, desembarcamos na comuna de Maratea, à noite, onde de longe avistamos Pietro que já nos aguardava na estação ferroviária. De alinhado porte, ele trajava um longo e bem caído capote escuro e chapéu de massa de longas abas. Acompanhava-se de um atarracado auxiliar, vestido de jaqueta de couro marrom e boina inglesa.
Firme e em silêncio, Pietro me tomou as malas e entregou para o assistente. Em sinal de boas-vindas, pegou-me pelos ombros e me beijou as faces, como reza a tradição calabresa. Respeitosamente, com um aperto de mão cumprimentou Elusa e nos conduziu até seu carro – um Fiat Uno de 4 portas, branco, com bancos recobertos de capa de malha azul estampada com simpáticas figuras de Mickey Mouse.
Seguimos à Praia a Mare, domicílio dos Guerrera, onde Angelina nos aguardava para o lauto jantar por ela preparado, com deliciosas entradas, pratos e sobremesas. Para beber, um vinho de excelente qualidade, produzido em campagna de propriedade da família.
Antes de tudo isso, Pietro sentenciou: - “Totó, tenho duas exigências a lhes fazer em nossa casa.” Curioso, perguntei quais eram e ele prosseguiu: - “A primeira é que vocês ocupem o nosso quarto, o principal da casa. Eu e Angelina iremos para um outro. A segunda, que vocês façam todas as refeições em nossa bendita cozinha, que é o lugar sagrado de nossa máxima familiaridade.”
Acatamos a cultura familiar tortorese e nos sentimos em casa. Enquanto Angelina insistia em reforçar o passadio de Elusa – “Você é tão magrinha... Tem que engordar! Mariuce, sua sogra, ficará orgulhosa”, dizia ela – eu e Pietro enfrentávamos mais uma garrafa do caseiro vinho. E Elusa a repetir que eu sustasse a bebida, para não causar má impressão aos primos.
Bem, no dia seguinte fomos à peixaria da praia comprar vongole e depois subimos à antiga Tortora, onde ao longo do sinuoso caminho me chamavam a atenção os suntuosos cartazes, com rebuscadas letras negras e douradas, de anúncio mortuário.
Totonho Laprovitera, na histórica escadaria. |
Chegando ao Centro Histórico da urbe, vi o silêncio tomar de conta das vias e praças. Nelas, serenamente, passavam as mulheres de luto fechado, ainda pelas perdas familiares da Segunda Guerra Mundial. Alguns curiosos chamavam o primo Pietro e, sussurrando, perguntavam quem eu era, o que fazia e o que eu queria por lá. Visitamos a casa da vovó Marianna e, sentado em sua histórica escadaria, fui fotografado em memorável retrato.
No dia seguinte visitamos em uma das principais praças públicas de Praia a Mare o “Monumento aos Heróis da Primeira Guerra Mundial”, onde consta o nome de tio Angelo Laprovitera. De lá, fomos a um antigo bar da cidade, mas não ficamos porque a Elusa estava conosco e o estabelecimento não permitia a presença feminina.
Para estender o passeio, seguimos à vizinha Paola, com direito a parar no “Il Brigante”, um conhecido entreposto de venda de souvenires. Quando estacionamos e descemos do carro, indaguei ao Pietro se seríamos breve no lugar, pois ele havia deixado o motor ligado. “Não, não, é que esqueci de desligar...”, e voltou ao veículo.
Totonho Laprovitera - Tortora - 2004 - AST - 30 x 40 cm. |
Por fim, retornamos ao lar dos Guerrera, afivelamos as malas e fomos à estação ferroviária de Praia a Mare. Emocionados, despedimo-nos do velho primo Pietro, embarcamos no trem e retornamos à Roma, já com a vontade de voltar à “Tortora, Tortorella!”
(Fotos: Elusa Laprovitera)
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