domingo, 4 de janeiro de 2015

Neguim


Eu não sei o nome do Neguim, mas, sei da sua peleja diária para escapar neste mundo tão apinhado de diferenças e descaso ao próximo. 

Sempre com o bom humor em dia, enquanto pastora e lava os carros estacionados, Neguim passa suas horas cantando e saudando os passantes. Com o sorriso escancarado, é uma figura partícipe da paisagem urbana da rua onde moro.

As vezes em que vou à padaria, eu o convido para merendar e digo pra ele escolher o que quiser. Aí, cheio de moral, com ar de desforra, ele entra no recinto e solicita para o balconista: “Fuleragem, bota aí o maior folheado e me dê uma Coca de 600, que a conta é do meu patrão!”. 

Quando chega o final de ano, lembrando do ensinamento de “o que nos sobra não nos pertence”, costumo separar umas roupas para o Neguim. 

- Ei, Neguim, quer uma camisa?!
- Ôpa, é nois! Quero!
- Mas, só se você disser quem é “o cara”! - Instigo.
- Esse cara é você! - Responde, cantarolando a música do Rei.
- Neguim, será que vai dar no seu tamanho?
- Se não der, a gente dá um jeito! 
- Neguim, e qual é o número do seu pé?
- De 37 a 43!
- Pois, pegue!
- Ei, meu patrãozinho, e um dinheirim?..
- Neguim, vá se lascar, vá... 

Aí, ele dá aquela gargalhada, sai todo satisfeito, feliz da vida, e eu penso como custa pouco pra gente alegrar o coração das pessoas.

(Foto: Totonho Laprovitera)

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