sexta-feira, 26 de outubro de 2012

"Gestual", por Romeu Duarte


Assim, Romeu Duarte apresentou a exposição "Gestual", de Totonho Laprovitera:

Francisco Antônio Laprovitera Teixeira, meu amigo e colega Totonho, brinda-nos neste quente outubro de 2012 com a exposição “Gestual”, em que apresenta 25 trabalhos, entre desenhos e pinturas, nos quais seu espírito irrequieto, experimental e inovador encontra livre curso. A mostra é dedicada a Aírton Monte, poeta-cronista ícone desta cidade, recentemente encantado. 

Artista visual renomado em nosso meio, Totonho, desde alguns anos, vem explorando o contato entre a figura, ainda que simplesmente sugerida, e a abstração, complexo exercício que tem atraído tanto a atenção daqueles que exercem quanto a dos que apreciam as artes visuais, em tempos de substituição das pinceladas e crayons por fátuos feixes de elétrons. 

Aliás, nesse particular, façamos um parêntese: a História da Arte define figurativismo como realista ou estilizado, desde que a percepção do objeto representado permita ao observador o seu reconhecimento, respectivamente, em maior ou menor grau. Como exemplo, as expressões pictóricas do Renascimento, do Barroco e do Realismo, que exigiam dos seus autores elevada capacidade técnica na busca por uma aproximada verossimilhança em suas representações da realidade. Mais tarde, no século XIX, o Impressionismo, o Cubismo e, na esteira deste, os diversos abstracionismos de toda sorte, nesta seqüência mesma, escancararam aberturas a outras maneiras de figurar, estas menos preocupadas com os contornos do real. 

Voltando aos trabalhos de Totonho, observamos desenhos bastante representativos de sua pessoal maniera artística, os quais revelam figuras retiradas do suporte em que se encontram mediante pinceladas de traços contínuos de maior ou menor largura, alguns dando a impressão de escaparem acrobaticamente ao papel. Evocam ainda, em sua composição, influências de El Lissitzki e de outros artistas construtivistas e suprematistas do cubo-futurismo russo, entrevistas no arranjo em diagonal das figuras, na mélange de ponto, reta e plano e nos diversos signos associados aos grafismos. Nas pinturas, o fundo multicor e abstrato, dir-se-ia quase psicodélico em seus matizes e texturas, serve de écran a estratégias figurativas em muito semelhantes às encontradas nos desenhos. Entretanto, aqui, pela reação da cena colorida em segundo plano com o protagonismo das muitas linhas e pontos, dá-se curioso efeito de ampliação do significado do que é representado no proscênio: onde termina a mulher envolta em céu e começa o panorama dos vários peixes luminosos vagando na imensidão de um mar de safira? Onde finda a trajetória da miríade de astros no céu noturno constelado e se inicia a sedução feminina que não veda, mesmo sob denso e escuro véu, a beleza cúpida de seios e púbis generosos? O artista arrisca uma explicação, que é também mais um enigma, a ser decifrado: “A arte não me é apenas uma atividade. Ela é um sentimento lúdico de brincar a vida a sério”. 

Quanto ao que vai na cabeça ou no peito, disse alguém, de que não me lembro, que a verdadeira arte faz pensar e sentir. A arte de Totonho, presente nesta “Gestual”, me faz dizer como Fernando Pessoa em seu “Labirinto”, no qual louva a alegre inconsciência e a consciência disso: “ah, canta, canta sem razão, o que em mim sente está pensando”. 

Muito obrigado. 

Romeu Duarte Junior, 53, é arquiteto e urbanista, professor do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFC, mestre e doutor em Arquitetura e Urbanismo pela FAUUSP e conselheiro vitalício do IAB.

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