terça-feira, 22 de maio de 2012

A virgem do Tabuleiro

Por Carlito Lima*. 


"Muita gente me pergunta se as Histórias do Velho Capita, escritas semanalmente, são verdadeiras ou inventadas. Afinal são 10 anos ininterruptos de historinhas, 520 semanas. Na verdade as fontes das histórias são notícias de jornais, escuta indiscreta de conversas nos botequins, amigos me passam fatos interessantes, até cartas recebo contando histórias. Aproveito o essencial, dou uma burilada, uma lapidada, apronto minha crônica sem linguajar rebuscado ou erudito, quero apenas ser compreendido pelos meus leitores, pelo povo simples de minha terra. Vejam amigos a carta recebida essa semana, a qual repasso sem acrescer ou tirar vírgula ou palavra. 

Meu querido Capita, 

Desculpe a intimidade de assim chamá-lo, entretanto, de tanto ler suas crônicas, me sinto próximo, como se fosse um amigo, um parente, por isso relato minha história de vida e de amor. Não precisa sequer trocar meu nome, pois já o troquei. Sou um jovem, 30 anos, trabalho muito, numa loja do Shopping, gerente, tenho salário razoável. Vivia no mundo da farra, da bebida, meu dinheiro gastava todo, mulheres, raparigas, é a verdade. Minha mãe aconselhava deixar essa vida, arranjar uma boa moça, casar ter filhos. Eu preferia minha vidinha de boemia. Até que apareceu uma jovem em busca de emprego, foi admitida. Moça prendada vestia roupa discreta, evangélica, tem fé e apreço por sua religião, filha de um pastor. 

Quando eu a vi despertou-me uma ardente química sensual. Toda dia ela chegava à loja discreta com vestidos longos, trocava de roupa, se pintava, transformava-se em uma tremenda gata. Não poderia imaginar que por baixo daquelas cumpridas saias havia uma mulher exuberante. Comecei a dar em cima da Deusa, nos primeiros meses, discreto, levava-a para tomar um sorvete, um lanche, ela sentiu meu interesse, fui levemente correspondido. Certa vez esperei sairmos do Shopping juntos, lhe dei carona até sua casa no Tabuleiro. Nessa noite fui enfático, não era mais menino gostava dela, suas atitudes e educação me agradavam. Ela pediu para pensar, precisava conversar com sua mãe, seu pai era rigoroso, não havia diálogo, altamente conservador. No outro dia pelo humor de Raquel senti que as coisas estavam para mim. Ao sair da loja, conversamos bastante, ela também tinha uma caidinha por mim, o problema era o pai, não podia saber por enquanto, só admitia namoro, com noivado e casamento. Assim iniciei uma fase romântica de minha vida. Com o tempo de namoro as intimidades foram crescendo, sou paciente, fui levando, namorando no carro como podia. Até que numa ocasião levei-a a um motel. A reação foi inesperada. Ao nos deitarmos ela confessou um probleminha, eu escutei comovido: 'Chico, meu pai é altamente conservador, ele não admite mulher não ser virgem até o casamento, faço o que você quiser, mas minha virgindade vai ser preservada.' Eu concordei e passamos a nos amar de todo jeito, até que um dia eu falei que jamais o pai saberia se era virgem ou não. Triste, Raquel respondeu. 'Todos os meses o pai me manda a um médico, amigo dele, para verificar in-loco minha virgindade. Ele repete, se não for mais virgem sai de minha casa.'

Aumentou minha vontade, minha paixão, o jeito foi noivar e casar. Fomos para lua-de-mel no Recife. Na primeira noite deu-se a grande decepção, constatei, Raquel não era virgem. A raiva tomou-me conta, quis retornar para casa e entregá-la ao pai. Ela chorou, pediu perdão, havia acontecido o desvirginamento a pulso. Depois de muitas conversas e desabafos, perguntei quem havia lhe tirado a virgindade. Ela confessou. 'Foi o doutor na última consulta, eu não queria, mas com jeito e força, aconteceu. Não contei antes com medo de acabar o casamento, pois lhe amo muito'. 

Fiquei muito brabo, depois amoleci, terminei perdoando, hoje vivo bem com minha mulher. Dou pouca importância não ter sido o primeiro, o que me chateia é ter sido o guardião de sua virgindade, o sacana do doutor. Pode contar minha história. Ficarei feliz em ler, mando foto de Raquel. Não é linda? Um abraço do Chico, seu leitor.”

* O alagoano Carlito Lima é ex-capitão do Exército Brasileiro, engenheiro, ambientalista e escritor.

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