domingo, 11 de janeiro de 2015

O bom samaritano

A equipe de trabalho.

Em Icó trabalhávamos o dia inteiro no centro histórico da cidade e, à noite, nos recolhíamos no Hotel do DNOCS em Orós. No entanto, apesar do intenso ritmo de trabalho, sobrava-nos tempo para desopilarmos um pouco. Certa vez, fizemos a base no Katakum Bar, vizinho ao cemitério e, depois, seguimos a uma boate, no Icó, da qual agora não recordo o nome.

Como eu estava com o fígado recém recuperado e acostumado com a alimentação bastante restrita, não precisou mais do que uma dose de rum com Coca e um espetinho de gato, de tira-gosto, para desassossegar meu fato. Aí, de repente, me bateu uma dor de barriga, daquelas de arrepiar até os cabelos do juízo. Meti o pé na carreira para o precário banheiro da boate e me posicionei. Trepado na sentina, eu parecia um goleiro na posição de defender um pênalti: agachado, de braços abertos – escorado nas divisórias – e atento ao tiro livre na grande área! No que trilou o “apito”, aliviei entre vendavais e trovões. Verificando que o temporal chovia caganeira, constatei a fatídica falta de papel! Quanto aperreio...

Porém, no fétido banheiro adentrou um indivíduo que, mesmo reclamando da catinga, se comoveu com a minha situação e se dispôs a me ajudar.

- Precisando de alguma coisa?
- Se o amigo puder me ajudar... 
- Em que, gente boa?
- Dá pra você conseguir papel higiênico?
- Na hura, cagão!
- O queeê?! 

E o bom samaritano seguiu rindo, rumo à sua boa ação. 

Ocorre que, na sua volta, o bom samaritano se enganchou com um cara que estava na porta à sua frente. Ele, com uma ruma de jornal nos braços, explicou que estava apressado, em missão de socorro a um cidadão em estado penoso na latrina. Não se entendendo, os dois se empurraram e começou a confusão! O pau comeu de esmola e eu, ainda naquela posição, clamei:

- Calma, pessoal, violência não leva a nada!

De nada adiantou, até chegar a turma do “deixa disso” e as namoradas dos valentões para separarem a briga.

Acalmados os ânimos, de posse dos periódicos, comecei a fazer uso deles para a necessária e urgente limpeza. Bateu-me a certeza de que papel só espalha, pois o que limpa mesmo é água. E haja jornal a escorregar, pegando uma velocidade doida!

Findo o serviço, o traseiro estava limpo e letrado de tantos textos de notícias. Molhei o cabelo, como disfarçasse o tempão que passei na latrina, e saí discretamente. Tudo bem, não fosse o bom samaritano, que de uma mesa superlotada me avistou e, chamando bastante atenção, exclamou: 

- E aí, gente boa, deu pra limpar o boga?!!

(Foto: Acervo Rosalinda Pinheiro)

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